sábado, 20 de abril de 2019

Óuspirdici!*

As férias eram na roça, no sítio dos meus avós, uma região simples e de bem poucos recursos. Ali nas terras do meu avô e seus vizinhos se produzia arroz, milho e feijão. Tudo no cabo da enxada, sob o sol escaldante. Preparar a terra, semear, capinar, colher era tudo trabalho essencialmente braçal. 

O que eles não produziam, como açúcar, por exemplo, tinham que comprar numa fazenda vizinha, em saca de 60 quilos. Na casa dos meus avós, a saca de açúcar cristal ficava guardada no quarto de dormir deles, atrás da porta, como se tesouro fosse. 

Na hora de fazer bolo, tínhamos que ir no quarto com uma tigela e uma xícara para medir a quantidade para a receita. Era um grande mistério para nós, crianças da cidade, como se assava bolo sem forno. Mas isso é tema pra outra história.

Crianças que éramos, não tínhamos tanta atenção com os detalhes. Abríamos o saco, medíamos três xícaras, fechávamos o saco e íamos pra cozinha dar andamento ao bolo. Logo mais meu avô ia ao quarto verificar se tínhamos fechado o saco direito. E daquela vez, viu cristaizinhos de açúcar caídos no chão.

Saiu brabo do quarto, dando bronca em todos, inclusive na minha avó, que segundo ele, deveria ter nos supervisionado. “Óuspirdici, minina! Onjasiviu dexá açúcar caí nu chão? Açúcar custa caro dimais da conta”**.

Aprendi ali que naquela roça todos tinham como prática quase que de sobrevivência combater o desperdício. Nem um grão de arroz ou feijão deveria ser perdido. Nem um cristalzinho de açúcar, porque o trabalho para consegui-lo era árduo e penoso.

Enquanto isso, nas cidades e nos dias atuais, os índices de desperdício de alimentos é algo obsceno. Se essas pessoas ao menos tivessem uma idéia do trabalho que é para produzir, talvez pensariam duas vezes antes de jogar fora uma banana só porque está pintadinha por fora.

Desperdício na minha casa é tabuzaoç. Não pode e ponto. Estou sempre olhando na geladeira, fruteira e armário. Verifico o que precisa ser consumido logo e me sirvo das sobras das comidas até acabarem antes de preparar outra. “Ah, só gosto de comida fresquinha” dizem alguns. E jogar dinheiro fora, você gosta?

*Olha o desperdício!
**Olha o desperdício, menina! Onde já se viu deixar açúcar cair no chão? Açúcar custa caro demais da conta.

#desperdicio
#trabalho
#respeitoaotrabalho
#valoresdefamilia
#feriasnaroça
#marinanoarblog
#lifestories
#storytelling
#vivendoeaprendendo
#historiasdevida

Nenhum comentário: